1984
- Rita Alves
- 17 de abr. de 2016
- 2 min de leitura
Este é um dos poucos casos em que o filme não desilude em comparação com o livro. 1984, de George Orwell, foi adaptado duas vezes ao cinema: uma versão em 1956 e a outra, curiosamente, em 1984. Esta última versão foi concebida por Michael Radford, todavia, quase podíamos confundir com a do próprio autor do livro.
1984 é o retrato de uma época futurista (embora influenciado pelos regimes fascistas que proliferavam pela Europa na altura da redação da obra, 1948) em que a sociedade se encontra subjugada a um único partido e controlada pelo Big Brother que está em todo o lado. Winston Smith (John Hurt) encontra-se numa profunda solidão e refugia-se nos seus pensamentos julgando ser o único lugar seguro.

Winston leva uma vida igual a todos os outros cidadãos: veste o macacão azul, vai para o trabalho, a televisão observa-o – na rua ou em casa - sem nunca ser desligada, as notícias sobre a Oceania e sobre a guerra com a Eurásia (ou com a Lestásia?) ocupam os silêncios. A constante voz de fundo das notícias origina um ambiente pesado e cansativo tanto para o espectador como para as personagens que, também graças aos tons acinzentados do filme, parecem estar sempre num estado apático e desgastado.
O patriotismo é representado pela figura do Big Brother e pelo opositor do Estado, Goldstein. Como se tivessem sido treinadas por Pavlov, as pessoas reagem à figura de Goldstein com ódio, raiva, gritos, insultos e, face à figura de Big Brother, começam a entoar uma canção, cruzam os braços por cima da cabeça e cantam em união.
Winston incorre no crime de pensar. Esconde um caderno onde escreve, na letra torta e desalinhada de quem usa material obsoleto, alguns dos seus pensamentos. Fá-lo de costas para a televisão, escondido, para que o Big Brother não o possa ver. Admira Golstein e a Resistência, mesmo não tendo a certeza se existem ou se, como muitas outras coisas, foi o Estado que inventou. Incorre ainda no crime carnal quando conhece Julia (Suzanna Hamilton) e ambos se envolvem sexualmente, sem pudor, somente por prazer.

O quarto que serve de ninho de amor a Winston e Julia é um dos melhores cenários do filme. Parece saído diretamente do livro para o ecrã de tão bem representado: a cama de casal, a mobília velha, o único quadro na parede, a janela de onde se vê a senhora de idade a cantar e a estender a roupa.
1984 é uma excelente adaptação da obra de Orwell. Escolhendo do livro as melhores citações, consegue tornar visual e transmitir ao espectador as emoções do livro. Os atores com o seu aspeto magro e pálido, as notícias, o tom escuro e o macacão azul unissexo formam o ambiente da sociedade fascista. O filme perde apenas na representação da infância de Winston que acaba por ser confusa e desencaixada. Para quem não leu o livro torna-se difícil de compreender as memórias da personagem - podiam ter sido mais exploradas e melhor representadas.
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